19º Domingo do Tempo comum - A busca fundamental

05/08/2013 07:56

A busca fundamental

A busca fundamental

 

 

1ª Leitura: Sb 18,6-9
Sl 32
2ª Leitura: Hb 11,1-2.8-19
Evangelho: Lc 12,32-48

32 Não tenha medo, pequeno rebanho, porque o Pai de vocês tem prazer em dar-lhes o Reino. 33 Vendam os seus bens e deem o dinheiro em esmola. Façam bolsas que não envelhecem, um tesouro que não perde o seu valor no céu: lá o ladrão não chega, nem a traça rói. 34 De fato, onde está o seu tesouro, aí estará também o seu coração.»

35 «Estejam com os rins cingidos e com as lâmpadas acesas. 36 Sejam como homens que estão esperando o seu senhor voltar da festa de casamento: tão logo ele chega e bate, eles imediatamente vão abrir a porta. 37 Felizes dos empregados que o senhor encontra acordados quando chega. Eu garanto a vocês: ele mesmo se cingirá, os fará sentar à mesa, e, passando, os servirá. 38 E caso ele chegue à meia-noite ou às três da madrugada, felizes serão se assim os encontra! 39 Mas, fiquem certos: se o dono da casa soubesse a hora em que o ladrão iria chegar, não deixaria que lhe arrombasse a casa. 40 Vocês também estejam preparados! Porque o Filho do Homem vai chegar na hora em que vocês menos esperarem.» 41 Então Pedro disse a Jesus: «Senhor, estás contando essa parábola só para nós, ou para todos?» 42 E o Senhor respondeu: «Quem é o administrador fiel e prudente, que o senhor coloca à frente do pessoal de sua casa, para dar a comida a todos na hora certa? 43 Feliz o empregado que o senhor, ao chegar, encontra fazendo isso! 44 Em verdade, eu digo a vocês: o senhor lhe confiará a administração de todos os seus bens. 45 Mas, se esse empregado pensar: ‘Meu patrão está demorando’, e se puser a surrar os criados e criadas, a comer, beber, e embriagar-se, 46 o senhor desse empregado chegará num dia inesperado e numa hora imprevista. O senhor o expulsará de casa, e o fará tomar parte do destino dos infiéis. 47 Todavia aquele empregado que, mesmo conhecendo a vontade do seu senhor, não ficou preparado, nem agiu conforme a vontade dele será chicoteado muitas vezes. 48 Mas, o empregado que não sabia, e fez coisas que merecem castigo, será chicoteado poucas vezes. A quem muito foi dado, muito será pedido; a quem muito foi confiado, muito mais será exigido.»


* 22-34: A aquisição de bens necessários para viver se torna ansiedade contínua e pesada, se não é precedida pela busca do Reino, isto é, a promoção de relações de partilha e fraternidade.
* 35-48: Esperando continuamente a chegada imprevisível do Senhor que serve, a comunidade cristã permanece atenta, concretizando a busca do Reino através da prontidão para o serviço fraterno. Os vv. 41-46 mostram que isso vale ainda mais para os dirigentes da comunidade, que receberam de Jesus o encargo de servir, provendo às necessidades da comunidade. A responsabilidade é ainda maior, quando se sabe o que deve ser feito (vv. 47-48).

Bíblia Sagrada – Edição Pastoral

A vigilância escatológica

Lucas nos faz ver nossa vida em sua dimensão verdadeira. Vivendo no ambiente mercantilista do Império Romano, Lc vê constantemente o mal causado pelas falsas ilusões de riqueza e bem-estar, além do escândalo da fome (cf. 16,19-31). Se escrevesse hoje, não precisaria mudar muito. No evangelho, nos ensina a vigilância no meio dessas vãs ilusões. A vigilância é uma atitude bíblica, desde a noite da libertação do Egito, quando o anjo exterminador visitou as casas dos egípcios, enquanto os israelitas, de pé, cajado na mão, celebravam Javé pela refeição pascal, prontos para seguir seu único Senhor, que os conduziria através do Mar Vermelho até o deserto (1ª  leitura). A vigilância é também a atitude do cristão, que espera a volta de seu Senhor, que encontrando seus servos a vigiar, os fará sentar à mesa e os servirá. Pois já fez uma vez assim (cf. 22,27). Jesus é o Senhor servo.

O trecho – se se adota a leitura extensa – continua com outras sentenças e parábolas referentes à Parusia. Explicam, de maneira prática, o que essa vigilância implica.
Ser um administrador sensato e fiel (12,42): cuidar do bem de todos os que estão em casa (pela pergunta introdutória de Simão Pedro, 12,41, parece que isto se dirige sobretudo aos líderes da comunidade). A vigilância não é ficar de braços cruzados, esperando a Parusia acontecer, mas assumir o bem da comunidade (cf. 1 Ts 5). Lc fala também da responsabilidade de cada um (12,47-48). Quem conhecia a vontade do Senhor e, contudo, não se preparou, será castigado severamente, ao invés do que não conhecia a vontade de seu senhor; este se salva pela ignorância … a quem muito se deu, muito lhe será pedido; a quem pouco se deu, pouco lhe será pedido.

O importante desta mensagem é que cada um, assumindo a gente que Deus lhe confiou no dia-a-dia, está preparando sua eterna e alegre companhia junto a Cristo, o Senhor que serve (o único que serve de verdade … ). Pois Cristo ama efusivamente a gente que ele confia à nossa responsabilidade. Não podemos decepcionar a esperança, que ele coloca em nós. A visão da vigilância como responsabilidade mostra bem que a religião do Evangelho não é ópio do povo. Implica até a conscientização política, quando, solícito pelo bem dos irmãos, a gente descobre que bem administrar a casa não é passar de vez em quando uma cera ou um verniz, mas também e sobretudo mexer com as estruturas tomadas pelos cupins …

Essa vigilância escatológica não é uma atitude fácil. Exige que a gente enxergue mais longe que o nariz. É bem mais fácil viver despreocupado, aproveitar o momento… pois quem sabe quando o senhor vem? (Lc 12,45). Para sustentar a atitude de ativa vigilância e solicitude pela causa do Senhor, precisamos de muita fé. Neste sentido, a 2ª leitura vem sustentar a mensagem do evangelho. É a bela apologia da fé, de Hb 11. A fé é como que possuir antecipadamente aquilo que se espera; é uma intuição daquilo que não se vê (11,1). Com esta “definição”, é claramente enunciado o teor escatológico da fé. O sentido original da fé não é a adesão da razão a verdades inacessíveis, mas o engajamento da existência naquilo que não é visível e palpável, porém tão real que possa absorver o mais profundo do meu ser. Hb cita toda uma lista de exemplos desta fé, pessoas que se empenharam por aquilo que não se enxergava. O caso mais marcanteé a obediência de Abraão e sua fé na promessa de Deus (11,8-19). O texto continua: muitos deram sua vida por essa fé, que fez Israel peregrinar qual estrangeiro neste mundo (11,35b-38). Mas o grande exemplo fica reservado para o próximo domingo: Jesus mesmo.

Convém, portanto, abrir os olhos para aquela realidade que não aparece e, contudo, é decisiva para a nossa vida. Sintetizando o espírito da liturgia de hoje, poderíamos dizer: o mundo nos é confiado não como uma propriedade, mas como um serviço a um Senhor que está “escondido em Deus”, porém na hora decisiva se revelará ser nosso amigo e servo, de tanto que nos ama, a nós e aos que nos confiou. Ou seja: já não vivemos para nós, mas para ele que por nós morreu e ressuscitou (para nos reencontrar como amigos) (Oração Eucarística IV). Nesta perspectiva, entende-se a bela oração do dia: somos adotados como filhos por Deus e esperamos sua herança eterna; ideia que volta no salmo responsorial, que descreve Israel como a herança que Deus escolheu para si; nós somos os responsáveis da herança de Deus, sua gente neste mundo.

Do livro “Liturgia Dominical”, de Johan Konings, SJ, Editora Vozes

Viver para aquilo que é definitivo

O fim para o qual vivemos reflete-se em cada uma de nossas ações. A cada momento pode chegar o fim de nossa vida. Seja este fim aquilo que vigilantes esperamos, como a noite da libertação, que encontrou os israelitas preparados para saírem (1ª  leitura), e não como uma noite de morte e condenação, como o empregado malandro que é pego de surpresa pela volta inesperada de seu patrão (evangelho).

Devemos preparar-nos para o definitivo de nossa vida, aquilo que permanece, mesmo depois da morte. Mensagem difícil para o nosso tempo de imediatismo. Muitos nem querem pensar no que vem depois; contudo, a perspectiva do fim é inevitável. Já outros veem o sentido da vida na construção de um mundo novo, ainda que não seja para eles mesmos, mas para seus filhos ou para as gerações futuras, se não têm filhos. Assim como os antigos judeus colocavam sua esperança de sobrevivência nos seus filhos, estas pessoas a colocam na sociedade do futuro. É nobre. Mas será suficiente?

Jesus abre outra perspectiva: um tesouro no céu, junto a Deus. Aí a desintegração não chega. Mas, olhar para o céu não desvia nosso olhar da terra? Não leva à negação da realidade histórica, desta terra, da nova sociedade que construímos? Ou será, pelo contrário, uma valorização de tudo isso? Pois, mostrando como é provisória a vida e a história, Jesus nos ensina a usá-las bem, para produzir o que ultrapassa a vida e a história: o amor que nos toma semelhantes a Deus. Este é o tesouro do céu, mas ele precisa ser granjeado aqui na terra.

A visão cristã acompanha os que se empenham pela construção de um mundo novo, solidário e igualitário, para suplantar a atual sociedade baseada no lucro individual. Mas não basta ficar simplesmente neste nível material, por mais que ele dê realismo ao empenho do amor e da justiça. A visão cristã acredita que a solidariedade exercida aqui na História é confirmada para além da História. Ultrapassa nosso alcance humano. É a causa de Deus mesmo, confirmada por quem nos chamou à vida e nos faz existir. À utopia histórica, a visão cristã acrescenta a fé, “prova de realidades que não se veem” (2ª  leitura ). A fé, baseada na realidade definitiva que se revelou na ressurreição de Cristo, nos dá a firmeza necessária para abandonar tudo em prol da realização última – a razão de nosso existir.

Do livro “Liturgia Dominical”, de Johan Konings, SJ, Editora Vozes.

 

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