6º Domingo da Páscoa/Ano C

29/04/2013 18:02

 

 

6º Domingo da Páscoa/Ano C

Jesus envia o Espírito Santo como advogado da comunidade cristã

1ª Leitura: At 15,1-2.22-29
Sl: 66
2ª Leitura: Ap 21,10-14.22-23
Evangelho: Jo 14,23-29

23 Jesus respondeu: «Se alguém me ama, guarda a minha palavra, e meu Pai o amará. Eu e meu Pai viremos e faremos nele a nossa morada. 24 Quem não me ama, não guarda as minhas palavras. E a palavra que vocês ouvem não é minha, mas é a palavra do Pai que me enviou. 25 Essas são as coisas que eu tinha para dizer estando com vocês. 26 Mas o Advogado, o Espírito Santo, que o Pai vai enviar em meu nome, ele ensinará a vocês todas as coisas e fará vocês lembrarem tudo o que eu lhes disse.»

A paz que só Jesus pode dar -* 27 «Eu deixo para vocês a paz, eu lhes dou a minha paz. A paz que eu dou para vocês não é a paz que o mundo dá. Não fiquem perturbados, nem tenham medo. 28 Vocês ouviram o que eu disse: ‘Eu vou, mas voltarei para vocês’. Se vocês me amassem, ficariam alegres porque eu vou para o Pai, pois o Pai é maior do que eu. 29 Eu lhes digo isso agora, antes que aconteça, para que, quando acontecer, vocês acreditem. 30 Já não tenho muito tempo para falar com vocês, pois o príncipe deste mundo está chegando. Ele não tem poder sobre mim, 31 mas vem para que o mundo reconheça que eu amo o Pai, e é por isso que faço tudo o que o Pai me mandou. Levantem-se. Vamos sair daqui.»


* 15-26: Advogado é alguém que defende uma causa. Jesus envia o Espírito Santo como advogado da comunidade cristã. O Espírito é a memória de Jesus que continua sempre viva e presente na comunidade. Ele ajuda a comunidade a manter e a interpretar a ação de Jesus em qualquer tempo e lugar. O Espírito também leva a comunidade a discernir os acontecimentos para continuar o processo de libertação, distinguindo o que é vida e o que é morte, e realizando novos atos de Jesus na história.

* 27-31: Jesus fala de paz e alegria no momento em que sua morte está para acontecer. Paz é a plena realização humana. Ela só é possível se aquele que rege uma sociedade desumana for destituído de poder. A morte de Jesus realiza a paz. Todo martírio é participação nessa luta vitoriosa de Jesus e, portanto, causa de paz e alegria.

Bíblia Sagrada – Edição Pastoral

 

Viver na presença de Cristo e de Deus

A nova Jerusalém é a “morada de Deus com os homens”, dizia-nos a utopia que escutamos domingo passado. Mas uma utopia serve para mostrar o sentido
da realidade presente. Hoje, a liturgia insiste na presença da utopia de Deus: a “inabitação” de Deus nos homens não acontece apenas na utópica Nova
Jerusalém, mas em cada um que guarda a palavra do Cristo, seu mandamento de amor. Pois a palavra do Cristo não é sua, mas a do Pai que o enviou (Jo 13,24; evangelho).

Os discípulos não entenderam isso logo. Por isso, grande parte dos primeiros anos do cristianismo decorreu em “tensão escatológica”: aguardava-se a vinda de Cristo com o poder do alto, a Parusia, como instauração do Reino de Deus. Só aos poucos, o cristãos começaram a entender que a nova criação já tinha iniciado, na própria comunhão do amor fraterno, testemunho do amor de Cristo a todos os homens. Esta compreensão, esta “memória esclarecida” de Cristo é uma das realizações, talvez a mais importante, do Espírito Santo.

Neste tempo intermediário, não devemos ficar com medo ou tristes porque Cristo não está conosco. Ele permanece conosco, neste Espírito, que nos faz experimentar a inabitação em nós dele e do Pai – portanto, muito mais do que significa sua presença na terra, pois o Pai vale mais do que a presença física de Cristo (14,28). Ele permanece conosco também no dom messiânico que ele nos deixa, a “paz”, porém, não como o mundo a concebe (14,27). Escrevendo isso, Jo parece polemizar com a idéia de paz dos tratados políticos (3) e também com o conceito judaico da paz messiânica, a realização de um Reino de Deus mundano, dirigido pelas mesmas leis e mecanismos que dirigiram os reinos até agora, portanto, uma paz que prepara a guerra …

Antes de ver o que é, no concreto, a inabitação de Deus e de Cristo entre nós hoje, é bom olhar para a sugestiva descrição da nova Jerusalém, na 2ª  leitura (cf. dom. pass.). Observemos alguns detalhes: os nomes das doze tribos de Israel e dos doze apóstolos, símbolos do novo povo de Deus fundamentado sobre os apóstolos; a ausência do templo – idéia cara ao N.T., já que Cristo substituiu o templo de Jerusalém pelo de seu corpo ressuscitado (cf. Jo 2,18-22 etc.); sua “iluminação”: a glória de Deus, e o Cordeiro, sua lâmpada. Não se deve explicar muito essas imagens, importa captar o que querem sugerir, num espírito global. É uma cidade que tem doze portas com os nomes das doze tribos, para acolhê-las no dia em que elas forem reunidas dos quatro ventos, para viverem na paz messiânica, tendo por centro só e exclusivamente Deus e o Cordeiro. É a cidade para viver na presença de Deus e Cristo. E isto é a paz.

Nossa comunidade cristã deve ser a antecipação da Jerusalém celeste. Tendo Cristo por centro e luz, certamente haverá unidade e comunhão entre seus habitantes. A 1ª  leitura de hoje pode ilustrar isso. O conflito na comunidade era grave, certamente tão grave quanto hoje o conflito entre os defensores da cristandade e os de uma Igreja-testemunha, despojada, que vai ao encontro dos mais pobres. O problema era análogo: a Igreja devia ser concebida como uma instituição acabada, à qual os outros se deveriam agregar? Neste caso, ela podia conservar suas instituições tradicionais, que eram judaicas. Ou seria a Igreja um povo a ser constituído ainda, aberto para a forma que o Espírito lhe quisesse dar? Para este fim, Paulo e Barnabé procuraram a união dos irmãos em redor daquilo que o Espírito tinha obrado junto com eles. Conseguiram. Não esforçaram em vão (cf. Gl 2,2). O “Concílio dos Apóstolos”, como se costuma chamar este episódio (At 15), confirmou a prática de admitir pagãos sem passar pelas instituições judaicas (circuncisão, sábado etc.). Apenas, em nome da mesma união fraterna, os cristãos do paganismo deviam abster-se de quatro coisas que eram realmente tabu para os judeu-cristãos; não respeitar isso seria tornar a vida em comunidade impossível. A caridade fraterna acima de tudo!

Na caridade fraterna, Deus e “o Cordeiro” moram conosco. A cidade de Deus não é uma grandeza de ficção científica, nem uma cristandade sociologicamente organizada. Ela é uma realidade interior, atuante em nós e, naturalmente, produzindo também modificações no mundo em que vivemos. Ela é obra do Espírito de Deus que nos impele.

(3) - Cf.a pax romana, ideologia da supremacia romana no mundo mediterrâneo no tempo de Cristo e dos primeiros cristãos.

Do livro “Liturgia Dominical”, de Johan Konings, SJ, Editora Vozes

 

Onde o amor e a caridade, Deus aí está 

É comum ouvir-se que a Igreja é opressora, mera instância de poder. Isso vem do tempo em que, de fato, a Igreja e o Estado disputavam o poder sobre a população. E os meios de comunicação se esforçam por manter essa imagem, como se nunca tivesse acontecido um Concílio Vaticano II, como se nunca tivessem existido o Papa João XXIII, Dom Hélder Câmara… Disse um psicólogo: “A sociedade precisa de manter viva a imagem de uma Igreja opressora para poder se revoltar contra quando pode revoltar-se contra o pai … ”

A liturgia de hoje nos faz ver a Igreja de outra maneira. Claro, ela ainda não é bem como deveria ser, aquela “noiva sem ruga nem mancha” que é a Jerusalém celeste da 2ª  leitura. Mas quem ama acredita que a pessoa amada é muito melhor por dentro do que parece por fora. Por isso, se amamos a Igreja, acreditamos que em sua realidade mais profunda ela é, mesmo, a noiva sem ruga nem mancha … Vista com os olhos do Apocalipse, a Igreja é a morada de Deus, a Jerusalém nova, em que não existe mais templo, porque Deus e Jesus – o Cordeiro – são o seu templo. Seu santuário é Deus mesmo, não algum edifício para lhe prestar culto. Deus está no meio de seu povo. Isto basta.

1ª  leitura descreve um episódio da Igreja que manifesta isso. Os apóstolos tiveram uma discussão sobre a necessidade de conservar-se os ritos judaicos na jovem Igreja, no momento em que ela estava saindo do mundo judeu e abrindo-se para outros povos, na Ásia e na Europa. Depois de oração e deliberação, os apóstolos chegaram à conclusão de que, para ser cristão, não era preciso observar o judaísmo (que tinha sido a religião de Jesus). Somente fossem observados alguns pormenores, para não escandalizar os cristãos de origem judaica. Os apóstolos reconheceram que o antigo culto do templo se tinha tornado supérfluo. O evangelho de hoje nos faz compreender por quê: “Eu e o Pai viremos a ele e faremos nele a nossa morada”, diz Jesus a respeito de quem acredita nele (João 14,23). Os fiéis são a morada de Deus. A Igreja, enquanto comunhão de amor, é a morada de Deus.

Não precisamos de templo concebido como “estacionamento da santidade”. O povo simples sente isso intuitivamente, quando arruma um galpão ou um pátio para servir de salão comunitário e capela e tudo, lugar de oração, de celebração, de reunião, para refletir e organizar sua solidariedade e sua luta por mais fraternidade e justiça. Sabe que não é nos templos de pedra que Deus habita, mas no coração de quem ama e vive seu amor na prática. “Onde o amor e a caridade, Deus aí está”.

Do livro “Liturgia Dominical”, de Johan Konings, SJ, Editora Vozes

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