REFLEXÃO DO 30º DOMINGO DO TEMPO COMUM - O VERDADEIRO DISCÍPULO

24/10/2012 14:28

 

O verdadeiro discípulo

30º Domingo do Tempo Comum/Ano B
1ª Leitura: Jr 31,7-9
Salmo: 125
2ª Leitura: Hb 5, 1-6
Evangelho: Mc 10, 46-52

* 46 Chegaram a Jericó. Jesus saiu de Jericó, junto com seus discípulos e uma grande multidão. Na beira do caminho havia um cego que se chamava Bartimeu, o filho de Timeu; estava sentado, pedindo esmolas. 47 Quando ouviu dizer que era Jesus Nazareno que estava passando, o cego começou a gritar: «Jesus, filho de Davi, tem piedade
de mim!» 48 Muitos o repreenderam e mandaram que ficasse quieto. Mas ele gritava mais ainda: «Filho de Davi, tem piedade de mim!» 49 Então Jesus parou e disse: «Chamem o cego.» Eles chamaram o cego e disseram: «Coragem, levante-se, porque Jesus está chamando você.» 50 O cego largou o manto, deu um pulo e foi até Jesus. 51 Então Jesus lhe perguntou: «O que você quer que eu faça por você?» O cego respondeu: «Mestre, eu quero ver de novo.» 52 Jesus disse: «Pode ir, a sua fé curou você.» No mesmo instante o cego começou a ver de novo e seguia Jesus pelo caminho.

* 46-52: O último milagre de Jesus é uma cura significativa. Ele não abre apenas os olhos do cego, mas também o coração. E o cego curado reconhece Jesus como o Messias (filho de Davi). E, com mais coragem do que Pedro (8,32) e do que o homem rico (10,22), segue a Jesus no caminho para a morte. Desse modo, Bartimeu torna-se o modelo do verdadeiro discípulo.

Bíblia Sagrada – Edição Pastoral

 

Jesus abre os olhos a quem procura ver

Embora caminho do Servo Padecente, a subida de Jesus a Jerusalém não deixa de ser também a chegada do Messias. Se, nos domingos anteriores, a liturgia acentuou, no paradoxal messianismo de Jesus, o lado da aniquilação, hoje ela insiste num sinal messiânico evidente: a cura de um cego (evangelho). A revelação de Jesus como messias “diferente” surge, portanto, da dialética entre o que se esperava do Messias e o que não se esperava dele. Depois da incompreensão dos discípulos em Mc 8,14-21, Jesus se manifesta como Messias abrindo os olhos ao cego de Betsaida (8,22-26). Se, por um lado, Jesus proíbe a publicidade (8,26), por outro, os “iniciados” (os discípulos) já viram bastante para que, logo depois, Pedro profira a profissão de fé: “Tu és o Messias” (8,29). Mas ele não sabe o que isso significa, pois ele pensa em categorias humanas (8,33). Ao fim das predições da Paixão, secção em que os discípulos são ensinados a respeito da natureza da missão do Cristo, embora sem a entender plenamente (8,27-10,52), Jesus cura novamente um cego: Bartimeu, o cego de Jericó. A este, Jesus não lhe proíbe publicar o acontecido; pelo contrário, o homem “segue Jesus”. Pois é chegada a hora de revelar seu messianismo, não só aos iniciados, mas à multidão reunida em Jerusalém. A cura de Bartimeu acontece na saída de Jesus de Jericó, na direção de Jerusalém, onde Jesus será acolhido, logo depois, como o rei messiânico (embora a multidão em 11,1ss saiba o que isso implica … ). Portanto, podemos dizer que, ao abrir os olhos a Bartimeu, Jesus deixa entrever seu messianismo a todo o povo de Israel.

Abrir os olhos dos cegos era um sinal messiânico de destaque. A 1ª leitura traz uma profecia, escrita por Jr para animar o “resto de Israel”, as tribos do Norte, deportadas pelos assírios em 721 a.C., sugerindo-lhes a perspectiva da volta (pois no tempo de Josias, ao iniciar Jeremias seu ministério profético, a Assíria estava muito fraca e Josias reconquistando a Samaria). As tribos serão reunidas. Mesmo os cegos e coxos estarão aí. Bartimeu é o representante desta profecia, quando Jesus sai de Jericó, na direção de Jerusalém, centro da antiga Aliança.

Mas Bartimeu é também o protótipo dos que querem ver. Esta é a condição para salvação. Ele é salvo, porque tem fé (10,52). Ele a demonstrou de modo palpável, insistindo em chamar a atenção de Jesus, apesar das reprimendas da multidão e dos próprios discípulos. Ele invoca Jesus como Messias (“Filho de Davi”), em plena multidão e Jesus confirma sua invocação pelo atendimento que lhe concede. Pressentimos aqui as multidões de Jerusalém aclamando Jesus como o que traz presente o “Reino de nosso pai Davi” (11,10). Mas, apesar de todo o entusiasmo, ele continuará seu caminho até o Gólgota.

A liturgia dos domingos do tempo comum não acompanha Jesus no resto do caminho da cruz: a Semana Santa é que faz isto. Portanto, será bom, neste 30° domingo, fazer uma meditação sintética sobre este caminho, que a alguns domingos estamos acompanhando. Caminho paradoxal, de sinais e desconhecimento, fé e incompreensão, entusiasmo e aniquilação … Cada um traz em si alguma esperança messiânica, alguma utopia. Será que ela corresponde ao critério de Cristo, que mostra ser, ao mesmo tempo, a negação e a plenitude daquilo que esperamos? Para receber em plenitude, precisamos admitir uma revisão daquilo que esperamos. Talvez seja isso que sugere a oração do dia: amar o que Deus ordena e receber o que ele promete.

A 2ª leitura é semelhante à de domingo passado. Situa o ser sacerdote de Jesus na sua solidariedade com os homens e com Deus ao mesmo tempo. Participando de nossa condição, santifica-a. É o pontí-fice por excelência. Não Jesus mesmo, mas também nenhuma instituição humana, lhe conferiu este poder. Ele pertence a uma linhagem sacerdotal que supera até a de Aarão, por ser primeira e de origem desconhecida, misteriosa: a linhagem de Melquisedec (cf. 14,18-20).

Do livro “Liturgia Dominical”, de Johan Konings, SJ, Editora Vozes

 

Será que finalmente enxergamos?

Nos domingos anteriores acompanhamos Jesus e os apóstolos na caminhada rumo a Jerusalém, que foi, como vimos, uma grande instrução sobre seguir Jesus e assumir a cruz. E vimos também que essa instrução encontrou cabeças duras, impenetráveis … Mc emoldurou toda a secção 8,27-10,45 (da proclamação messiânica de Jesus por Pedro até o 3° anúncio da paixão e a correspondente lição) entre dois milagres simbólicos, duas curas de cego. Na primeira, Mc 8,22-26, o trabalho era duro: Jesus
teve de repetir seu gesto de cura. Já depois da instrução do caminho, em Mc 10,46-52, a cura se dá com maior facilidade, e o homem curado é admitido na companhia
de Jesus para segui-lo até Jerusalém (pois o fato ocorreu em Jericó, início da última etapa da viagem). Mc registra até o nome do cego, Bartimeu, provavelmente conhecido entre os primeiros cristãos.

Mesmo no fim do caminho, os apóstolos não compreenderam, mas um cego chegou a ver com clareza, para seguir Jesus pelo caminho. Compreender Jesus não é uma questão de status na Igreja (aqueles apóstolos que queriam ocupar os primeiros lugares, cf. domingo passado), mas de deixar-se transformar por Jesus. Aliás, no ponto final da caminhada de Jesus, no Gólgota, os apóstolos vão primar pela ausência; só vamos encontrar aí as mulheres que acompanharam Jesus pelo caminho. Portanto, o seguimento radical de Jesus pelo caminho até a cruz não é privilégio do clero …

Que os cegos vêem e os coxos saltam e caminham é um sinal do tempo messiânico. A 1ª leitura de hoje o anuncia pela boca do profeta Jeremias. Este imaginou o tempo da salvação como a volta dos israelitas deportados para Jerusalém, com inclusão de cegos e coxos. Assim, o cego de Jericó, que aclama Jesus como “filho de Davi” (= Messias), vai participar da entrada de Jesus em Jerusalém e juntar sua voz à da multidão, que vai saudar Jesus com essa mesma saudação messiânica (Mc 11, 9-10). No dia do Messias, este e os cegos entram juntos na cidade de Deus …

Será que nós nos deixamos abrir os olhos para seguir o Messias na etapa decisiva de sua caminhada? Para isso, precisamos saber que somos cegos: não temos, por nós mesmos, a capacidade de seguir Jesus no seu caminho messiânico, caminho de amor e justiça radicais. Muitas vezes somos tão obcecados pelas miragens do progresso e do consumo que nem suspeitamos de nossa cegueira. Mas o cego de Jericó invoca Cristo, é por ele curado e segue-o no caminho que outros, em condições bem melhores, não quiseram seguir (por exemplo, o homem rico … ). Imagem de nossa sociedade, de nossa cristandade. O povo dos pobres, submerso nas trevas da opressão econômica e da dominação cultural, que lhes impede ter uma visão do que está acontecendo, encontra em Jesus quem lhe abre os olhos, de modo que possa segui-lo, desimpedido e participando com ele, até a cruz que liberta os irmãos e irmãs.

Do livro “Liturgia Dominical”, de Johan Konings, SJ, Editora Vozes

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