Reflexão sobre a Festa da Dedicação da Basílica do Latrão

05/11/2012 15:05

 

O corpo de Jesus é o novo Templo

1ª Leitura: Ez 47,1-2.8-9.12
2ª Leitura: 1Cor 3,9c-11.16.17
Evangelho: Jo 2,13-22

* 13 A Páscoa dos judeus estava próxima, e Jesus subiu para Jerusalém. 14 No Templo, Jesus encontrou os vendedores de bois, ovelhas e pombas, e os cambistas sentados. 15 Então fez um chicote de cordas e expulsou todos do Templo junto com as ovelhas e os bois; esparramou as moedas e derrubou as mesas dos cambistas. 16 E disse aos que vendiam pombas: «Tirem isso daqui! Não transformem a casa de meu Pai num mercado.» 17 Seus discípulos se lembraram do que diz a Escritura: «O zelo pela tua casa me consome.»

18 Então os dirigentes dos judeus perguntaram a Jesus: «Que sinal nos mostras para agires assim?» 19 Jesus respondeu: «Destruam esse Templo, e em três dias eu o levantarei.» 20 Os dirigentes dos judeus disseram: «A construção desse Templo demorou quarenta e seis anos, e tu o levantarás em três dias?» 21 Mas o Templo de que Jesus falava era o seu corpo. 22 Quando ele ressuscitou, os discípulos se lembraram do que Jesus tinha dito e acreditaram na Escritura e na palavra de Jesus.

* 13-22: Para os judeus, o Templo era o lugar privilegiado de encontro com Deus. Aí se colocavam as ofertas e sacrifícios levados pelos judeus do mundo inteiro, e formavam verdadeiro tesouro, administrado pelos sacerdotes. A casa de oração se tornara lugar de comércio e poder, disfarçados em culto piedoso. Expulsando os comerciantes, Jesus denuncia a opressão e a exploração dos pobres pelas autoridades religiosas. Predizendo a ruína do Templo, ele mostra que essa instituição religiosa já caducou. Doravante, o verdadeiro Templo é o corpo de Jesus, que morre e ressuscita. Deus não quer habitar em edifícios, mas no próprio homem.

Bíblia Sagrada – Edição Pastoral

 

Consagração da Basílica do Latrão

Na festa da dedicação da basílica do Latrão, em Roma, celebram-se, de fato, as catedrais de todas as dioceses do mundo. A basílica do Latrão foi a primeira catedral do mundo. Igreja catedral é a Igreja do bispo do lugar. A igreja dedicada a S. João Batista e a S. João Evangelista, no morro do Latrão, em Roma, foi durante muito tempo a igreja do bispo de Roma, o papa. E como o papa exerce a “presidência da caridade” entre os bispos do mundo inteiro, a igreja catedral do Latrão simboliza todas as dioceses.

Mas o que se celebra não são templos de pedra e sim os templos do Espírito, as comunidades dos fiéis. A liturgia de hoje se refere continuamente ao templo de pedras vivas, que são as comunidades cristãs, e ao templo que é o corpo de Cristo, ressuscitado, que substitui o templo do antigo Israel. O evangelho deixa isso bem claro. Conforme Jo, já no início de sua atuação pública, Jesus chega a Jerusalém por ocasião de uma romaria pascal e expulsa do templo não só os abusos (como descrevem os outros evangelistas, Mt 21,12-13 par.), mas os próprios animais do sacrifício. Em outros termos: expulso o culto do templo. E quando as autoridades lhe pedem um sinal profético que possa respaldar tal gesto inimaginável, Jesus aponta o sinal que só depois (2,22) os discípulos vão conhecer: o sinal de sua ressurreição.

A Basílica de São Francisco de Assis
Basílica de Latrão é considerada a igreja-mãe de todas as igrejas católicas, por ser a catedral do Papa, bispo de Roma. A igreja originária foi construída pelo imperador Constantino, durante o pontificado de papa Melquíades no séc. IV, no terreno doado por Fausta, esposa do Imperador. Nela foram realizados os quatro primeiros Concílios Ecumênicos realizados no Ocidente: em 1123 para resolver a questão das Investiduras, (o provimento em algum cargo eclesiástico por parte do poder civil): em 1139, sobre questões disciplinares; em 1179 para tratar da forma de eleição do Papa; em 1215, sobre várias heresias e a reforma eclesial. Em 1209, no local onde hoje está a atual Basílica, Francisco e seus onze companheiros receberam a aprovação do papa Inocêncio III para iniciar sua forma de vita. Antes, conta-nos as legendas, o papa “tinha visto em sonhos que a basílica de Latrão prestes a ruir, mas sendo sustentada por um religioso, homem pequeno e desprezível, que a sustentava com seu ombro para não cair. E disse: ‘Na verdade este é o homem que, por sua obra e por sua doutrina, haverá de sustentar a Igreja’. Foi por isso que aquele senhor acedeu tão facilmente ao seu pedido e, a partir daí, cheio de devoção de Deus, sempre teve especial predileção pelo servo de Cristo” (2Cel 17).A atual construção data de 1735, e a assistência religiosa na Basílica está confiada aos frades Franciscanos.

O templo antigo pode ser destruído (como de fato ele foi, em 70 d.C., alguns anos antes de João escrever seu evangelho), mas Jesus “fará ressurgir” um novo templo em três dias: o templo de seu corpo, de sua pessoa. Jesus é templo, santuário, lugar de culto a Deus, de encontro com Deus. Nele, a Palavra de Deus armou tenda entre nós (Jo 1,14). Nele também é oferecido a Deus o único culto da nova Aliança, o dom da própria vida por amor.

Ora, ao templo que é Jesus associa-se o templo de pedras vivas que é a comunidade. A 1ª carta de Pedro (cf. canto da comunhão) apresenta uma bela homilia pascal, para os novos batizados, neste sentido. Eles devem se aproximar (termo do culto) da pedra rejeitada, Cristo, que pela ressurreição se tomou pedra angular, alicerce (cf. a “primeira pedra” de uma igreja). Eles são assim o edifício “espiritual” ( = constituído pelo espírito, a força ativa de Deus, que ressuscitou também Jesus). E nessa comunidade é que se oferece o “sacrifício espiritual” (= promovido pelo Espírito de Deus) (7), que é a prática da vida cristã (ler 1Pd 2,4-10 e Rm 12,1). Paulo (2ª leitura) usa uma imagem semelhante, ao falar de seu trabalho de fundação da igreja de Corinto. A comunidade é construção de Deus, morada do Espírito. O alicerce, posto pelo próprio Paulo, é Cristo. Adiante, ao proscrever a imoralidade sexual, ele aplica essa mesma imagem ao comportamento pessoal dos fiéis (1Cor 6,19).

A abertura dessas imagens é fornecida pela “utopia de Ezequiel”, na qual aparece a descrição do novo templo, a ser construído quando os exilados da Babilônia voltarem à Judéia (lª leitura). Ezequiel vê a fonte do templo (o riacho do Gion) como um rio caudaloso que saneia as águas e as margens e até o Mar Morto… Um símbolo da salvação que deve fluir do novo templo. Pela “lógica da liturgia”, isso se aplica a Cristo e à sua comunidade (cf. Jo 7,3 7-39). A comunidade de Jesus deve ser a edificação de Deus da qual sai a água salvadora para a humanidade.

(7) Ou talvez: “em sentido espiritual” (= tipológico, alegórico), daí a tradução “sacrifício/culto verdadeiro” (em oposição aos sacrifícios provisórios do A.T.)

Do livro “Liturgia Dominical”, de Johan Konings, SJ, Editora Vozes

 

A Igreja de Pedras vivas e o sacrifício espiritual

A liturgia da dedicação da basílica do Latrão, primeira catedral (igreja episcopal) da cristandade, sugere a extensão a todos os templos cristãos em todas as dioceses do mundo, as “Igrejas particulares”, nas quais está presente a Igreja universal a serviço da qual está disposto o bispo de Roma, o Papa.

Ora, ao se observar bem, a liturgia não realça os templos de pedra, os edifícios góticos, barrocos… Realça o novo templo “espiritual” que é Cristo ressuscitado e a comunidade, templo de “pedras vivas”, alicerçada nele (pelo trabalho do apóstolo). E a própria atuação do cristão é o “sacrifício espiritual”do novo culto.

”Espiritual”, neste contexto, não quer dizer o oposto de material. Quer dizer o que é suscitado pelo Espírito de Deus (ou talvez: interpretado à luz do Espírito de Deus). Ora, isso não é coisa no ar. Os frutos do Espírito são coisas bem concretas: amor fraterno, alegria, paz, etc. (Gl 5,22). O sacrifício espiritual (1Pd 2,5; Rm 12,1) implica em coisas bem concretas e materiais: é a própria vida cotidiana do cristão, vivida em amor fraterno eficaz.

São esses os sacrifícios oferecidos no novo templo que somos nós. Em nossa comunidade de amor eficaz, baseado em Cristo, Deus se torna presente muito mais do que no templo de Jerusalém.

Do livro “Liturgia Dominical”, de Johan Konings, SJ, Editora Vozes

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